Já era tarde e estava chovendo. Marina com seus olhos alagados, tinha o olhar perdido na direção da janela. Tinha vida escapando na sua expiração, tinha dor saindo pelos poros. E ela sentiu falta de ser uma criança e brincar na poça d’água quando chovia. Sentiu falta de brincar de rodar com a boca aberta e a língua de fora em dias de chuva, e não ver mal algum nisso porque não existia mal algum pra ver.
Fazia mais de três noites que o travesseiro não segurava o peso do seu descontentamento. Seus braços ao redor de seus joelhos apertados contra o peito. Sua boca seca de palavras que ela não conseguia verbalizar. Seus olhos molhados de lágrimas que não rolavam. Marina teve medo de nunca sentir direito e morrer afogada em sua tristeza.
Em nenhum outro momento da vida ela havia se sentido assim. E ela sempre teve medo de sentir, porque isso significava doer. E ela sempre escondeu suas lágrimas, porque acreditava que isso era fraqueza. E lembrou de seu avô dizendo “a menina Marina não chora”. Por um momento ela quis ser aquela garotinha orgulhosa outra vez. Mas percebeu que passou a vida se escondendo do inevitável.
Contemplou a si mesma no reflexo da janela. Percebeu que nada no mundo poderia prepará-la pra tamanha perda. Ela entendeu que não se escreve uma vida observando chover, mas se banhando em cada gota. Abrindo os braços, pisando na poça e pondo a língua de fora pra sentir o gosto da chuva.
Marina, o peso do mundo não tem peso pra te impedir de ser menina.
Vá brincar na chuva! ♡
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