Desde criança eu achava que ser famoso era um problema. Conhecia nomes como Michael Jackson, Whitney Houston e achava que ser muito talentoso e muito conhecido tinha um preço muito alto. Nunca quis pagar o preço da fama, mas sempre fui uma pessoa muito artística. Ser artista e não querer ser famosa parecia não fazer sentido no mundo, mas sempre fez muito sentido na minha cabeça.

Nunca gostei da ideia de ter que abrir mão da minha privacidade e ainda hoje, não sendo famosa e me sentindo cada dia menos artista, eu ainda acho um absurdo quando as pessoas espezinham aqueles que estão sob os holofotes porque “foram eles que escolheram” ou porque são “pessoas públicas”.

Acho que ninguém em sã consciência escolhe ser massacrado em público. É claro que existem pessoas que fazem de tudo pela atenção, que é a moeda da vez, mas não acho que elas tenham total noção das implicações disso tudo. A conta sempre chega e até a mais exibida das pessoas uma hora percebe que tem mais ônus do que bônus em ter a sua vida e a sua imagem expostas na maior parte do tempo.

Isso sempre me fez admirar artistas mais low profile — a Sandy muito mal posta uma foto, que dirá fazer um reality show dela nos stories. Aprendi que esse era o jeito certo de existir, mas ter uma voz pequena (não apenas para cantar) significa entre tantas coisas aprender a identificar o que está saindo de mim e brigar para me fazer ouvir algumas vezes.

A sensação de ser constantemente interrompida e abafada no meio de tantas outras vozes é cansativa para quem não tem tino para a briga e prefere se recolher do que participar da pancadaria. Mas as escolhas que a gente faz sempre têm seus desafios e às vezes cabe uma reflexão mais detalhada das batalhas que a gente está evitando lutar só para evitar a fadiga. Não é como se a fadiga pudesse ser evitada, então que a gente pelo menos a enfrente por algum motivo que faça sentido.

Por exemplo, é muito fácil ficar brava por alguém ter reproduzido em megafone uma ideia que eu sussurrei no meu canto por medo de parecer incisiva, maluca ou intrometida demais. Depois que a ideia é validada (e “ideia” é só um exemplo) a gente não tem tanta vergonha assim dela, mas enquanto ela ainda é só uma voz desconexa na nossa cabeça, a segurança necessária para colocá-la para fora também não dá as caras. Mas é treinando a nossa habilidade de errar sem se desmontar que a gente fortalece esse músculo.

Eu sei, eu sou a primeira pessoa a odiar me ver vulnerável na frente dos outros, dizer a coisa errada e precisar pedir desculpas, confundir a utilidade de alguma coisa, não entender uma piada ou gaguejar tentando defender um ponto, mas posso te garantir que odiar me ver no lugar de quem erra nunca me protegeu de errar e errar feio (e rude) de vez em quando. Repasso essas cenas embaraçosas na minha cabeça pelo menos duas vezes por dia todos os dias, mas sigo aqui vivinha.

É claro que as coisas na internet ganham outra proporção, dimensões cada vez mais perigosas no mundo caótico que eu jurava que só era ampliado pela globalização, mas hoje realmente acredito que está muito pior do que já foi, especialmente por causa da globalização. Mas se você é do tipo de pessoa que vai dormir relembrando uma vergonha que passou no inverno de 2013, pode confiar no seu tino. Você não vai fazer nada tão sem noção assim publicamente que comprometa o seu sono pelos próximos 5 anos.

A vergonha e o medo que você sente são de pessoas que não te conhecem bem o suficiente para acertar na previsão catastrófica de um comentário debochado. É muito louco pensar que existem pessoas sendo desagradáveis umas com as outras pagando internet para isso, mas infelizmente não é algo que podemos controlar. E o que podemos controlar é tão pouco, quase nada.

E é muito triste hesitar e desistir de quem a gente é e da mensagem que quer passar por medo de pessoas que nem se conhecem de verdade, e nem estão dispostas a fazer o trabalho interno. Porque elas não acham que precisam melhorar a si mesmas, mas piorar o mundo, porque assim elas não têm o trabalho de enxergar que elas são o problema. O que não faz sentido é você silenciar a sua voz para deixar que alguém com muito volume e pouca qualidade tenha cada vez mais lugar num espaço que não é só dela.

A bronca de ser vista é grande. Tem que se bancar, tem que aguentar uns desconfortos diferentes dos quais você lida agora. Mas eu venho pensando nisso cada dia mais, porque o cansaço e o desânimo estão a ponto de nos transformar em uma versão tão cínica e rancorosa quanto as pessoas que dormem e acordam com a intenção de acabar com o dia de quem quer que cruze o caminho delas.

A gente deseja mais do que viver uma vidinha encolhida e triste no rodapé qualquer de alguma página. Infelizmente não tem caminho fácil para isso e a gente vai ter que aguentar o cegar das luzes quentes no nosso rosto, as várias vozes gritando e o frio na barriga de ficar de pé na frente desse mundaréu de gente e defender o que acredita, mesmo que nem todo mundo embarque nessa com a gente.


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