autoconhecimento · música · vida no exterior

Categoria: Contos & Crônicas Page 1 of 21

Contos, crônicas e produções textuais sobre amor, a vida e amizade.

Cama sem cabeceira

Passei muitos anos morando na casa dos meus pais, dormindo em uma cama que era par de uma beliche. A estrutura era de ferro e o estrado era de madeira. Depois de muitos anos, aquela cama começou a ficar muito barulhenta. Era insuportável dormir nela porque qualquer mínimo movimento que eu fizesse à noite me acordava por causa do barulho da cama.

Quando eu estava perto de me mudar, ganhei uma cama nova, mais alta, mais firme, com um baú onde eu cabia (mas que usei para guardar as minhas coisas) e sem cabeceira. A ausência de cabeceira me pegou desprevenida, porque eu fazia muitas coisas da minha cama, recostada na cabeceira, de perninhas cruzadas e com paz de espírito. Mas precisei me adaptar à essa nova configuração.

Como não consigo ver nada como apenas a coisa em si, comecei a fazer diversas conexões sobre a falta de cabeceira da minha nova cama e a vida. Depois de muitos anos lidando com o incômodo de uma cama desconfortável (com a qual eu já estava mais do que acostumada) e barulhenta, foi finalmente perto do momento de ter que deixar de me apoiar nos meus pais que eu também perdi o apoio da cama.

Sei lá, na minha cabeça isso equivale a tirar as rodinhas da bicicleta para aprender a se equilibrar. Foi (e tem sido) estranho, mas menos conflituoso do que eu achei que seria. E como uma boa parte das coisas que eu decidi fazer na minha vida, eu me abri para a possibilidade de me sentir desconfortável antes de me adaptar. Faz parte de tudo o que é novo e diferente. Mas se a gente entende que é o melhor, a coisa lógica a ser feita é se jogar.

Já faz mais de seis meses que eu tive a ideia de escrever este texto e eu continuo pensando da mesma forma. A vida dá medo e não dá muitas garantias. O risco é assustador, mas é a única forma da gente ter certeza se alguma coisa vale a pena. O frio na barriga nunca passa, as inseguranças sempre gritam no ouvido, mas se você sabe exatamente o que deseja e confia que tem o que é preciso, você vai encontrar o seu caminho, o seu equilíbrio. Mesmo que sua bicicleta não tenha mais as rodinhas ou que sua cama não tenha mais uma cabeceira.

“If you desire to do something, there is a part of you deep down that knows you’re capable or else you wouldn’t waste your time thinking about it.”

Jen Sincero

Instagram | YouTube | Pinterest

As coisas vão te afetar de todo o jeito

Era uma tarde quente de verão e eu sei o quanto este começo soa básico, mas realmente era uma tarde quente de verão. A casa estava iluminada pela luz natural que entrava pelas janelas e o vento (artificial) balançava as cortinas enquanto o som da TV, em algum programa aleatório, criava uma trilha sonora destoante do que eu estava sentindo.

Eu nunca realmente tentei colocar em palavras porque achei bonito demais e quis guardar em algum lugar dentro de mim — e só para mim. Mas me peguei lembrando daquele dia e do que eu senti e decidi que já era hora de deixar de silenciar a minha voz numa tentativa inútil de me proteger de viver.

O que eu senti naquele dia foi justamente o oposto de me proteger de viver. Aquilo foi entender que não tem como escapar da vida estando aqui. Ela vai acontecer de qualquer maneira. As coisas vão te afetar de todo o jeito. E a você cabe apenas a decisão de tentar, em vão, se proteger de tudo ou ir em busca de coisas pelas quais você pode se machucar, mas que valerão a pena.

Então, naquela tarde quente de verão, em que a casa estava iluminada e as cortinas dançavam ao som da vinheta de um programa aleatório de fofoca (provavelmente não era isso, mas quem se importa?), você trocava a letra de uma música superconhecida para fazer piada de alguma mania minha que você tinha acabado de aprender, enquanto eu via tudo quase em câmera lenta.

Respirei fundo tentando dar conta da compreensão que tinha acabado de me atingir. Em cheio. Senti saudades daquele exato momento enquanto ele ainda acontecia. Olhei para nós como quem percebe de fora e quis, de alguma maneira, eternizar o momento — fotografar, tatuar, escrever uma música. Mas só consegui olhar para tudo com o máximo de atenção que eu pudesse porque não queria me distrair.

Pensei em tudo o que ainda está por vir e percebi que a gente nunca mais seria as mesmas duas pessoas daquela tarde. Pensei na vida que muda, na efemeridade das coisas, na ilusão de que a gente tem todo o tempo do mundo e fiquei triste por um pequeno segundo pensando que eu queria poder segurar aquele momento, impedir o tempo de passar e viver ali para sempre.

Quase imediatamente a minha tristeza foi interrompida pela leveza da sua presença sempre tão iluminada e alegre. E fui, mais uma vez, inundada por diversas impressões ao mesmo tempo. Sim, aquele momento não duraria para sempre. Nós mudaríamos, a vida mudaria, o tempo passaria e nada nunca mais seria daquela forma outra vez. Mas te ver cantarolando um refrão famoso e parodiado me fez abraçar a brevidade do momento e me emocionar com a possibilidade de viver tudo o que fica, vai e volta com você.

O medo de nunca mais sermos o que somos, naquele momento, se transformou em entusiasmo, em ânimo para conhecer todas as nossas futuras fases e versões. Eu senti uma gratidão profunda por poder sentir tantas coisas bonitas e assustadoras ao mesmo tempo. Eu compreendi que, o que quer que viesse de normal, entorpecido ou doloroso depois daquela tarde, valeria a pena.

Ter o meu coração partido pela vida depois daquele dia, para mim, significaria ter vivido o suficiente para chamar um mínimo pedaço da brevidade desta minha existência de “felizes para sempre”. E isto segue em mim desde então. 🖤

As peças do meu quebra-cabeça

Photo by Gabriel Crismariu on Unsplash

No vídeo de ontem do canal (aqui) eu mandei um recado pra minha versão do passado. Falei sobre coisas que eu acho que poderiam ter acontecido de outra forma e por quê. É claro que não passou de uma brincadeira (em tom sério) e de uma reflexão que leva em consideração que a pessoa que pode definir pra onde minha vida tá indo é a minha versão no presente. E, quem me deu o repertório que existe à minha disposição pra saber quais são as melhores opções agora foi a minha versão do passado. Mas não só ela.

Ao longo da vida fui ouvindo e absorvendo impressões das pessoas à minha volta sobre mim e, mesmo tendo citado no vídeo coisas que dizem e que a gente não deve levar pro coração, existem muitas pessoas que observam e enxergam a gente de verdade. E são essas pessoas que dizem as coisas mais importantes, mesmo que de um jeito tímido. Se a gente se abrir pra perceber e receber essas palavras, elas vão servir como peças no nosso próprio quebra-cabeça.

Fui ouvindo coisas ao longo da vida que funcionaram como dicas pra eu descobrir quem eu sou e que vez ou outro pipocam na minha cabeça como um lembrete disso. Ou como um incentivo muito bem vindo em certos momentos. Abaixo eu aponto e explico algumas dessas coisas.

EU NÃO PRECISO TER VERGONHA POR NÃO PENSAR E AGIR IGUAL A TODO MUNDO
Não é que eu seja a diferentona do rolê, mas no meu círculo social (especialmente o familiar) eu sou a pessoa que não compra muita a cartilha do que você deve fazer para agradar os outros. E não é de propósito, eu só fui criada respeitando aquilo que eu sinto (minha mãe até falou disso no nosso vídeo sobre espiritualidade – aqui) e aprendi na prática que não dá pra fazer o que todo mundo espera e sair disso sendo você mesmo depois. Quem me acordou pra vida foi a pessoa mais parecida e diferente de mim na vida que é o meu pai. Se tem uma pessoa diferentona, é ele. E ele uma vez me disse e me fez entender que tudo bem não ser igual a todo mundo. E não é que eu seja a pessoa mais única e exclusiva do mundo. É só que nem sempre eu vou concordar ou corresponder às expectativas dos outros. E tudo bem.

“EU SOU UMA CONTROL FREAK, O QUE EU QUERO, EU CONSIGO”
Usei esse trecho de CUTE BUT PSYCHO da Manu Gavassi porque toda vez que lembro disso essa música me vem na cabeça. Lembrei disso não tem muito tempo, mas quando ganhei meu primeiro violão (quando eu tinha 13 anos), meu irmão falou que eu conseguia tudo o que eu queria. Não tenho memória suficiente pra lembrar em que tom ele falou isso, mas conhecendo a personalidade dele, eu acredito que foi numa boa e de uma maneira incentivadora (afinal de contas ele fez parte da minha criação por ser nove anos mais velho). Recentemente essa memória acendeu na minha cabeça e eu fiquei me perguntando cadê aquela Elisa que não sossegava até conseguir alguma coisa, o que me leva ao próximo tópico.

EU CORRO ATRÁS DOS MEUS SONHOS
Recebi isso de alguns amigos e achei muito fofo! Porque meus amigos são as pessoas que mais têm acesso ao caos que minha cabeça fica de vez em quando e, mesmo assim, eles me enxergam como essa pessoa motivada, que não desiste, que bate cabeça, faça chuva ou faça sol tá ali fazendo o melhor que pode pra não deixar de fazer o que acredita. Não sei até que ponto eles acham isso realmente admirável, mas aí eu já tô querendo muito e me importando com coisa que não preciso me importar tanto assim, afinal…

EU TENHO MAIS O QUE FAZER
Eu dei muita risada quando disseram isso pra mim e não pude deixar de concordar. Depois de lidar com algumas coisas repetidas vezes, eu aprendi a não supervalorizar alguns sofrimentos e dificilmente as pessoas me veem fazendo drama sobre alguns assuntos específicos que são motivo de muito drama pra muita gente. E isso porque eu descobri que existem coisas muito importantes pra mim e em mim que precisam muito mais da minha atenção do que perder energia com coisas que já foram decididas e precisam de tempo e espaço pra curarem. Eu realmente tenho mais o que fazer!

Tenho certeza que investigando bem, todo mundo encontra pelo menos uma coisa boa que ouviu de alguém e essa coisa pode funcionar como dica ou combustível pra gente trabalhar na nossa melhor versão. Você consegue se lembrar de algo assim?

Page 1 of 21

Desenvolvido em WordPress & Tema por Anders Norén